Escrito por Carla Elliff
Traduzido por Gustavo Shintate
Revisão por Ana Carolina Grillo
Sou uma grande fã da interdisciplinaridade. Para mim, não tem como falar sobre um ecossistema como os recifes de corais e não terminar se debruçando sobre assuntos diferentes, combinando perspectivas diferentes de várias áreas para construir uma base sólida de conhecimento sobre eles. Então eu vi que a série da National Geographic “Explorer Classroom” tinha uma aula sobre ecologia histórica de corais, o que fisgou a minha atenção! E digo isso considerando o grande tsunami de aulas e palestras online que vem acontecendo!
A aula foi dada por Jonathan Cybulski, aluno de doutorado da Universidade de Hong Kong. Ele dá uma aula dinâmica e hilária (com direito a máscara de mergulho e snorkel). Mas se você não tiver 50 minutos para se dedicar a isso, vou te dar um resuminho.
Ecologia histórica é o estudo de interações passadas de humanos com plantas e animais. Pode ser considerado um parente próximo da Arqueologia e da Paleontologia, por exemplo.
Cybulski estuda a história de interações humanas com os corais. No seu doutorado ele investiga as influências que levaram ao forte gradiente leste a oeste de diversidade de corais encontrado em Hong Kong – com alta diversidade no leste e baixa diversidade no oeste. Existem condições naturais que poderiam estar direcionando esta distribuição, mas o quão influente é a presença humana?
Ele começa mostrando esta famosa série de fotografias que vão de 1975 até 2014 indicando o aumento de degradação em Carysfort Reef, EUA.
Fig. 1 Aumento de degradação do recife de coral em Carysfort Reef (Santuário Marinho Nacional de Florida Keys, EUA) no decorrer do tempo (Fonte: Science Friday)
Cybulski usa estas fotos para explicar o conceito da síndrome do referencial relativo (tradução livre de shifting baseline syndrome). Este tema recorrente em ecologia histórica foi cunhado pelo Dr. Daniel Pauly. Pauly é um renomado biólogo de peixes e, como citado por Cybulski, disse:
“A cada nova geração, a expectativa de várias condições ecológicas muda. O resultado é que as linhas de base vão piorando de forma quase imperceptível “.
Ok, mas o que isso significa para os recifes de corais? Suponhamos que as fotos antigas de Carysfort Reef não existam. Se víssemos o recife pela primeira vez em 2014, veríamos apenas a paisagem degradada e provavelmente teríamos baixas expectativas de como ela ficaria se restaurada a sua antiga glória.
Um grande problema que faz com que isso aconteça é que registros de degradação ambiental progressiva são raros. Temos estas fotos das últimas décadas de Carysfort Reef, mas e de outros lugares? E mais, se humanos existem há alguns milhares de anos, há quanto tempo estamos modificando o meio ambiente? O que podemos fazer? Quem poderá nos ajudar? Ecologistas históricos!
Para responder a algumas destas questões, Cybulski coletou testemunhos sedimentares de sua área de estudo. Estes testemunhos são como grandes canos empurrados ao fundo do mar para resgatar um registro de todas as camadas de corais vivos contemporâneos, acima de corais mortos antigos, sedimentos, outros seres mortos antigos e assim por diante. Este perfil de camadas novas para mais antigas pode então ser lido como um registro de como o ambiente se parecia há anos e anos atrás. Incluindo quais corais estavam presentes na área antigamente, permitindo uma comparação com quais corais estão presentes hoje.
Fig. 2 Exemplo de um testemunho sedimentar marinho, uma espécie de “cápsula do tempo” do nosso ambiente (Fonte: Wikimedia Commons)
Então, o que mudou na comunidade de corais de Hong Kong?
Os dados coletados mostram que a comunidade de corais mudou de espécies de corais majoritariamente ramificadas para espécies massivas. Corais ramificados crescem rapidamente e criam habitats mais complexos, o que faz com que sejam importantes para a manutenção da diversidade e sucesso dos recifes. Grandes perdas de corais ramificados alteram toda a estrutura da comunidade nos recifes, o que vem ocorrendo em muitos locais ao redor do mundo.
Apesar disso, como dito por Cybulski, a história não termina neste tom triste. Estes resultados estão sendo usados para informar trabalhos de conservação. Por exemplo, sabendo quais espécies de coral estavam presentes em uma determinada área antes dos humanos, é possível reproduzir estes organismos e colocá-los nos melhores lugares possíveis como medida de restauração.
Fig. 3 Exemplos de restauração de corais em um laboratório. Pequenas colônias são cultivadas em condições controladas antes de serem transplantadas para o ambiente natural. (Fonte: NOAA)
Isto é, para mim, um dos aspectos principais de todas as disciplinas que olham para o passado. Qual o motivo de saber como eram os corais há centenas ou milhares de anos atrás? Por que as pessoas estudam as políticas de guerras lutadas há tanto tempo? Por que é importante pensar sobre nossas origens? A resposta para todas estas questões é que olhar para o passado nos faz entender nosso presente e prever o futuro.
Não perca a apresentação completa do Jonathan Cybulski no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=qX0tjs71gvU
Muito obrigado Jonathan Cybulski pela ajuda com este artigo!