Escrito por: Jasmine Haskell
Editado por: Danielle Moloney
Traduzido por: Ana Carolina Grillo
Revisado por: Jessica Bleuel
Pinky e Cérebro finalmente tiveram sucesso em seu plano de dominar o mundo? Ainda não completamente, mas ratos invasores do sudeste da Ásia conseguiram dizimar com sucesso a vida selvagem nativa de muitas ilhas ao redor do mundo. Na verdade, ratos invasores foram culpados pela decadência ecológica e sociológica dos Rapa Nui (Ilha de Páscoa). Enquanto esta teoria ainda é amplamente debatida, as invasões de ratos nos últimos séculos provaram ser um grande incômodo, com alguns países iniciando programas de erradicação de ratos para ajudar a reduzir o problema e restaurar as populações de espécies nativas. Ilhas tropicais são particularmente suscetíveis a danos ecológicos por ratos pois muitas delas possuem espécies endêmicas (espécies encontradas exclusivamente nessas ilhas) e/ou não possuem espécies de mamíferos nativos, permitindo assim que as populações de ratos explodam neste nicho aparentemente inexplorado.
Ao longo de muitas centenas de anos, humanos têm navegado pelos oceanos do mundo para explorar e negociar, parando de porto em porto e, ao fazer isso, inadvertidamente trazendo ratos viajantes com eles nos cascos de navios ou canoas. Os ratos interferiram em seu novo ecossistema, perturbando as vias de nutrientes, as rotas de polinização e consumindo uma enorme quantidade de sementes de árvores, pássaros e seus ovos. É por meio da perturbação destas vias de nutrientes, das rápidas taxas de reprodução e dos apetites vorazes que estas espécies invasoras de ratos são muito possivelmente capazes de influenciar o comportamento dos peixes recifais.
Uma premiada opção de menu para estes ratos invasores são as aves marinhas e seus ovos. A densidade de aves marinhas é cerca de 760 vezes maior em ilhas sem ratos quando comparadas às ilhas infestadas por ratos. As aves marinhas são vetores críticos para o transporte de nutrientes, pois seu guano (excremento) contém altos níveis de nitrogênio e outros nutrientes chave. Estes nutrientes então são lavados para o mar e transportados para os recifes de coral mais próximos, atuando como um fertilizante natural. Este é um processo crítico para estas ilhas coralíneas, já que recifes de coral precisam de nitrogênio e ele é um nutriente limitante nestes ambientes. Com a presença de ratos, este ciclo é interrompido à medida que as populações de aves marinhas declinam rapidamente.
Um estudo recente por Gunn e colaboradores (2023) comparou o comportamento dos peixes-donzela-jóia ao redor de cinco ilhas infestadas de ratos e cinco ilhas livres de ratos no Arquipélago de Chagos, no Oceano Índico. Todas as 10 ilhas neste estudo apresentaram impacto humano relativamente baixo, eliminando fatores adicionais para as populações de ratos. O peixe-donzela-jóia foi selecionado para este estudo devido à sua natureza territorial bem estudada e prevalência nos recifes de coral. A pesquisa demonstrou que os peixes-donzela-jóia que habitam águas próximas de ilhas infestadas de ratos estavam menos interessados em proteger sua fonte de alimento e patrulhavam territórios maiores do que suas vizinhas livres de ratos. Isso pode ser explicado pela qualidade de sua fonte alimentar, as algas. Devido à reciclagem de nutrientes aprimorada pelas aves marinhas em ilhas livres de ratos, as algas ao redor dessas ilhas eram nutricionalmente mais densas, e portanto, de maior qualidade, em comparação com as algas ao redor de ilhas infestadas de ratos. Portanto, os peixes-donzelas-jóia eram menos agressivos em relação à sua fonte alimentar ao redor das ilhas infestadas de ratos porque estavam ganhando menos rendimento nutricional por unidade de esforço de forrageamento (em outras palavras, não valia a pena o esforço).
Isso tem vários efeitos para os próprios peixes-donzela-jóia e para o ecossistema em geral. À medida que seu alimento se torna menos valioso nutricionalmente ao redor de ilhas infestadas por ratos, os peixes-donzela-jóia apresentam taxas de crescimento mais lentas quando comparados aos peixes ao redor de ilhas livres de ratos. As manchas de algas “cultivadas” e fortemente protegidas por esses peixes apresentam taxas mais altas de produtividade primária do que aquelas que não são agressivamente protegidas. Isto pode ter amplas implicações quando pensamos na eficiência fotossintética das algas e na captura de carbono. As manchas de algas dos peixes-donzela-jóia também podem influenciar o assentamento de larvas de coral, havendo um menor recrutamento de corais juvenis dentro destas manchas de algas “cultivadas” quando comparadas a manchas fora das áreas protegidas.
Com os peixes-donzela-jóia protegendo áreas maiores devido à redução do valor nutricional de sua fonte alimentar próxima às ilhas infestadas de ratos, isso poderia potencialmente afetar negativamente o assentamento de larvas de coral. A agressividade reduzida destes peixes também influencia o comportamento social de outras espécies de peixes recifais, recrutando ou encorajando certas espécies a coabitarem na mesma área. Por exemplo, o comportamento de forrageamento do peixe-borboleta mostrou ser intensamente influenciado pela agressividade dos peixes-donzela-jóia. Além disso, a densidade de peixes cirurgiões ao redor de territórios de peixes-donzela-jóia mostrou ter uma correlação negativa. Isso não significa que a dominância sobre uma espécie de peixe “seja preferível” à outra, mas sim que o comportamento entre as espécies de peixes é interconectado e complexo, e que a alteração do comportamento de uma espécie pode afetar outras.
Embora o problema da invasão de ratos persista em muitas ilhas do mundo, programas de erradicação bem-sucedidos têm tido grande sucesso. A ilha de Lord Howe é um exemplo. Antes do programa de erradicação em 2019, havia aproximadamente 1000 ratos para cada pessoa na ilha. Os ratos causaram a extinção de 5 espécies de aves, 13 invertebrados e 2 espécies de plantas. Assim que os ratos foram erradicados, as populações de aves ameaçadas começaram a florescer, espécies de plantas adormecidas emergiram mais uma vez e o som dos grilos voltou à ilha. A persistência contínua na erradicação dos ratos tem o potencial de restabelecer o equilíbrio do ecossistema, reacendendo as interações entre as espécies. Com esses efeitos negativos tão impactantes demonstrados pelas ilhas invadidas por ratos descritas no estudo de Gunn et al. (2023), a erradicação dos ratos poderia levar a recifes mais saudáveis. Com mais pesquisas acerca do comportamento animal e de processos ecossistêmicos poderemos descobrir mais efeitos ecológicos negativos aparentemente estranhos.
Imagem: (Reefcause Conservation, https://conservation.reefcause.com/rats-alter-coral-reef-populations-the-chagos-islands-story/)

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